Aporte de Coletivo Intervozes al Foro de Deterioro del Debate Público

Remitente: Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social

Grupo de interés: Organización sin fines de lucro

Idioma: Portugués

¿Cuál cree que es, actualmente, el rol del Estado ante el Deterioro del Debate Público? ¿Cuál debería ser el rol del Estado ante el Deterioro del Debate Público?

Antes de falar do papel atual do Estado na deterioração do debate público, é preciso lembrar que, no caso brasileiro e de outros países da América Latina, o Estado sempre foi omisso diante da concentração dos meios de comunicação e da falta de acesso universal à Internet por parte dos cidadãos, ignorando princípios constitucionais e resultando numa esfera pública de debates extremamente excludente e invisibilizadora para a maior parte da população brasileira. Em períodos específicos de nossa história, além de omisso o Estado contribuiu para ampliar a concentração da mídia e das telecomunicações, por meio da distribuição de verbas publicitárias e de regulações que favoreceram fusões e aquisições de empresas.

Atualmente, o governo federal brasileiro segue silente diante de inúmeras infrações – inclusive de conteúdo, como violações a direitos fundamentais na programação das TVs – e usa verbas de publicidade estatal para favorecer aliados políticos no setor midiático. Em troca, ganha espaço nesses veículos para disseminar o discurso governamental, muitas vezes marcado por desinformação, principalmente sobre processos eleitorais e sobre a pandemia da Covid-19. O mesmo discurso é disseminado de maneira massiva na Internet, por meio de sites apoiadores e financiados pelo governo Bolsonaro e das redes sociais do presidente da República e seus aliados – incluindo outros agentes públicos, integrantes dos poderes Executivo e Legislativo.

Num contexto de polarização política, uma parte do Parlamento brasileiro tem buscado a aprovação de leis para enfrentar a desinformação e regular as plataformas digitais – como é o caso do PL 2630/20, já aprovado no Senado, aguardando votação na Câmara dos Deputados. Um dos avanços trazidos pelo projeto de lei visa regular os processos de moderação por parte das plataformas, de modo a impedir remoções arbitrárias de conteúdo por parte das redes sociais e serviços de mensageria. Também no Congresso Nacional, uma Comissão Parlamentar de Inquérito busca encontrar disseminadores (públicos e privados) de campanhas orquestradas de fake news. O Parlamento brasileiro, entretanto, pouco fez desde a redemocratização do país para favorecer um ambiente plural e diverso na mídia brasileira e, recentemente, aprovou mudanças no marco regulatório das telecomunicações que dificultarão ainda mais a universalização do acesso à Internet no país.

Em relação ao Judiciário, as cortes superiores – em especial o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral – têm atuado com alguma celeridade no enfrentamento à desinformação, com inquéritos abertos para investigar grupos, relacionados ao governo federal, que têm usado fake news para atacar as instituições do país. Decisões de primeira e segunda instância também têm condenado responsáveis por contas disseminadoras de conteúdo danoso. Falta, entretanto, ao conjunto da Justiça, uma maior compreensão sobre o tema, de modo a não cercear discursos legítimos e protegidos pelo direito à liberdade de expressão e, ao mesmo tempo, impedir que discursos de ódio e violadores de direitos humanos sigam circulando na Internet. Falta, ainda, responsabilizar agentes públicos que, abertamente, incentivam ódio e promovem uma cultura de violência no país, silenciando grupos já socialmente excluídos e oprimidos.

Ao Estado cabe também regulamentar os dispositivos constitucionais que visam promover a liberdade de expressão, a pluralidade e a diversidade, de forma a estimular um ambiente favorável ao debate público.

¿Cuál cree que es, actualmente, el rol del sector privado ante el Deterioro del Debate Público? ¿Cuál debería ser el rol del sector privado ante el Deterioro del Debate Público?

Diferentes atores do setor privado contribuem para a deterioração do debate público, de diferentes maneiras. Uma delas, ao oferecer serviços baseados na busca pelo lucro, passam por excluir da esfera pública um conjunto significativo de vozes, já marginalizadas e minorizadas historicamente. É o que acontece, por exemplo, quando operadoras de telecomunicações deixam de oferecer o acesso à Internet – ou o oferecem a preços inacessíveis e com baixíssima qualidade – em zonas e regiões empobrecidas de diferentes países.

No Brasil, de acordo com a pesquisa TIC Domicílios 2020, enquanto 100% dos lares da classe A e 99% da classe B possuem acesso à Internet, 36% das residências das classes D e E seguem desconectadas. No país, 68% das pessoas que não tem acesso à internet dizem estar desconectadas porque o serviço é muito caro. Para 32%, o motivo é a falta de oferta na região em que vivem. Vale destacar ainda os acordos de tarifa zero (zero rating) firmados por operadoras de telecomunicações e determinados aplicativos, que potencializam a concentração do acesso à rede via determinadas plataformas, impedindo aos usuários o acesso ao conjunto das informações e conteúdos disponíveis na Internet.

Para quem tem acesso à rede, a deterioração do debate público também resulta da arquitetura e dos modelos de negócios das redes sociais e serviços de mensageria privada. Ao visar a maior permanência e engajamento possível dos/as usuários/as em suas plataformas, em busca de dados pessoais e oferta de publicidade direcionada, os algoritmos das grandes plataformas são desenhados para expor prioritariamente aos/às usuários/as conteúdos o mais atrativos possível – seja via temas de maior aceitação por cada um (reforçando as bolhas e câmaras de eco), seja via conteúdos extremistas e/ou sensasionalistas, incluindo postagens desinformativas e de discurso de ódio.

Tal arquitetura e a oferta cada vez mais personalizada e direcionada de publicidade (incluindo ações de micro-targeting) têm rendido receitas bilionárias a plataformas como Google e Meta (ex-grupo Facebook). Em 2020, juntas, as empresas arrecadaram US$ 219 bilhões em publicidade – o equivalente a 34% do mercado (https://d2ksis2z2ke2jq.cloudfront.net/uploads/2021/06/groupmglobaladforecast_June2021.pdf)

Por fim, o setor privado da radiodifusão e da imprensa escrita nacional também contribuem para a deterioração do debate público (como detalharemos a seguir) ao excluir do jornalismo e dos conteúdos audiovisuais que produzem a diversidade de opiniões, visões, realidades, culturas e as diversidades de classe, gênero, raça e etnia presentes na sociedade. De acordo com estudo do Monitor de Propriedade de Mídia (MOM), realizado no Brasil pelo Intervozes em parceria com a Repórteres sem Fronteiras, as quatro principais redes de TV somam mais de 70% de toda a audiência do país, onde a TV aberta tem um alcance principalmente nas classes C, D e E (http://brazil.mom-rsf.org/es/). Cenários similares de concentração acontecem em outros países da América Latina (http://latin-america.mom-rsf.org/es/).

Diante do crescimento das indústrias de desinformação, uma parte da imprensa brasileira desenvolveu iniciativas de verificação de fatos, que têm contribuído para o enfrentamento da disseminação massiva das chamadas «fake news» no país. A atuação de parcela dos veículos de imprensa também tem sido significativa no sentido de combater desinformações sobre a pandemia da Covid-19 e das vacinas. Porém, diante da atual deterioração do debate público no Brasil, também fruto de processos históricos já mencionados, caberia ao setor privado uma ação muito mais efetiva no sentido de promover a diversidade de vozes e expressões no país, por meio de ações de ampliação do acesso da população a fontes de informações e à Internet; de combate sistemático às práticas de desinformação; e por mudanças nos modelos de negócio das plataformas digitais, capazes de garantir ambientes livres de ódio, de violações de direitos humano

¿Cuál cree que es, actualmente, el rol de las y los usuarios de internet ante el Deterioro del Debate Público? ¿Cuál debería ser el rol de los usuarios ante el Deterioro del Debate Público?

Algumas iniciativas colocam nos/as usuários/as a responsabilidade por buscar informações confiáveis e diversas nas mídias e nas redes sociais e por verificar os conteúdos recebidos antes de compartilhar, evitando, por exemplo, a propagação de desinformação. No entanto, o papel dos/as usuários/as na deterioração do debate público não pode ser compreendido de forma separada do debate sobre o papel do Estado e do setor privado neste processo, como desenvolvemos nas duas questões anteriores. A ausência de pluralidade e de diversidade na mídia, a desigualdade no acesso às fontes de informação e à Internet, o zero rating associado ao modelo de franquias de dados, a concentração dos/as usuários/as em poucas plataformas e o modelo de negócios dessas plataformas, que estimulam o efeito bolha, as câmaras de eco, a disseminação de desinformação e de discurso de ódio, fazem com que os/as usuários/as tenham pouco controle sobre seus próprios dados pessoais e sobre a circulação de informação.

Ao contrário, os/as usuários/as deveriam ter um papel ativo na formulação de políticas públicas de comunicação e de tecnologias. Embora a educação para as mídias seja um instrumento importante para empoderar os/as usuários/as, ela precisa estar acompanhada de mudanças nos sistemas de comunicação e de Internet que permitam com que os/as usuários/as realmente exerçam sua cidadania, de forma que os/as cidadãos/ãs se insiram num ambiente convergente na condição de sujeitos e não apenas de objetos de conglomerados, governos e tecnologias.

Considerando a web como espaço do exercício de direitos e vivência democrática, consideramos importante no debate sobre os/as usuários/as a ideia de “empoderamento digital”, que englobaria os seguintes pontos:

(1) a indivisibilidade entre o direito à comunicação e outros direitos humanos, cuja garantia deve se dar também no ambiente online;

(2) a diversidade e o pluralismo como formas de expressão da liberdade de expressão de indivíduos e coletividades;

(3) o conhecimento como uma construção coletiva e compartilhada;

(4) a constituição das Tecnologias da Informação e da Comunicação como instrumentos democráticos a serem apropriados de forma ativa pelos sujeitos;

(5) o combate a opressões e a defesa da Justiça Social e da democracia política como valores e objetivos associados a essas práticas.

E, como dimensões da garantia do direito à comunicação por meio do empoderamento digital, devem ser consideradas questões como:

(1) acesso;

(2) apropriação tecnológica;

(3) diversidade, pluralidade e liberdade de expressão; e

(4) privacidade (https://intervozes.org.br/arquivos/interdoc023daciedc.pdf).

¿Quiénes considera usted que son las personas, grupos de personas, o instituciones más vulnerables ante el Deterioro del Debate Público? ¿Por qué considera que los actores mencionados en la pregunta anterior son los más vulnerables?

Os grupos mais vulneráveis são as «minorias». E é preciso ressaltar que uma minoria não está sempre em menor número na sociedade. A «minoria», nesse caso, não se refere a um número menor de pessoas, mas sim a uma situação de desvantagem social. Não é o fator numérico que define uma população como minoria, mas as relações de dominação entre os diferentes subgrupos da sociedade, onde os grupos dominantes determinam o padrão que delineiam o que se entende por minoria em cada lugar.

Considerando que a deterioração do Debate Público deve ser entendida como qualquer ação articulada intencional, isolada ou de forma coordenada para manipular fatos e propor narrativas de interesses limitados, há deterioração provocada por diversos fatores que afastam as pessoas do debate público e impactam toda a sociedade, em maior ou menor grau. No entanto, as «minorias» ou grupos vulnerabilizados são afetados de forma mais intensa. Atitudes excludentes, discriminatórias e preconceituosas são uma tônica comum que afetam os grupos minoritários ou vulnerabilizados. Por consequência, os afasta do debate público.

Estamos falando de vários grupos diferentes que estão sub-representados ou em estão em desvantagem no jogo de poder social, seja esse poder econômico ou político, englobando:

1- Minorias étnico-raciais formadas a partir do colonialismo e das estruturas racistas da sociedade.

2- Minorias nacionais, que são grupos minoritários e vulneráveis que compartilham da mesma etnia, cultura, religião e costumes característicos de um determinado local.

3- Minorias sociais indígenas, que se encontram em situação de vulnerabilidade social e em processo de exclusão e de ameaças oriundas do agronegócio, de grileiros, garimpeiros e grupos políticos que avançam sobre a ocupação de terras indígenas.

4 – População de baixa renda ou abaixo da linha da pobreza, outro grupo fortemente excluído dos sistemas sociais contemporâneos, e por consequência do debate público, salvo pelo período eleitoral, com acesso nenhum ou precário à Internet e a um sistema educacional que têm sido desvalorizado.

5 – Mulheres, que têm sido os principais alvos de discurso de ódio e de violência, incluindo violência política, na Internet.

6 – A população LGBTQIA+, que sofre diariamente agressões físicas, verbais, psicológicas por meio também da Internet.

7 – As pessoas com deficiência, que no Brasil representam quase 25% da população, segundo o último levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). As pessoas com deficiência visual em especial são um dos grupos de minorias mais afetados e vulneráveis quando se trata do debate público.

Além de serem representados no parlamento federal por menos de 1% dos deputados, são totalmente excluídos pela mídia a partir de falhas enormes de acessibilidade, o que empurra as pessoas com deficiência para o silêncio, provocando exclusão e não oferecendo condições de acesso às informações para colaborarem com as questões relevantes ao debate público.

¿Cómo afecta el Deterioro del Debate Público particularmente a poblaciones en situación de vulnerabilidad, como población LGBTI, pueblos indígenas, mujeres, personas afrodescendientes y personas con discapacidad?

A pouca visibilidade dos grupos citados soma-se à pouca representatividade e diversidade das minorias em espaços públicos de tomada de decisão. Isso afeta diretamente a participação no debate público, e em consequência, fragiliza a democracia. Mais que isso, qualquer decisão política sem a fala dos mais desfavorecidos, se transforma em um «monólogo» perigoso, onde a opressão é palco dos atores que chegam ao poder político. O número de deputados negros (soma de pardos e pretos, segundo critério do IBGE) cresceu quase 5% nas eleições de 2018 na comparação com 2014, mas o grupo continua sub-representado na Câmara dos Deputados em relação ao tamanho da população. Dos 513 deputados eleitos, 385 se autodeclaram brancos (75%); 104 se reconhecem como pardos (20,27%); 21 se declaram pretos (4,09%); 2 amarelos (0,389%); e 1 indígena (0,19%), segundo a Agência Câmara de Notícias. Para a representatividade de pessoas com deficiência o caso é mais grave. Apenas dois candidatos com deficiência alcançaram o Congresso Nacional nas eleições 2018. Num país que tem 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, os números apontam concretamente para uma deficiência do sistema.

Mesmo com o aumento da bancada feminina na Câmara de Deputados de 51 para 77 deputadas em 2018, o que corresponde a 15%, o Brasil ainda continua bem abaixo da média da América Latina e do Caribe, onde a média do número de mulheres parlamentares nas Câmaras de Deputados ou Câmaras Únicas é de 28,8%, segundo a Agência Câmara de Notícias. Mesmo com o recorde de candidaturas nas eleições de 2018, com 160 membros LGBTs eleitos, segundo dados divulgados pela Aliança Nacional LGBTI, apresentando um crescimento de 386% em relação ao último pleito, esse grupo é ainda afetado de diversas formas para exercer o direito conquistado de forma democrática.

Se a população LGBTIQIA+, povos indígenas, mulheres, afrodescendentes e pessoas vivendo com deficiências não têm espaços assegurados de fala e de representatividade, o processo de deterioração do debate público cria um ambiente social repressor e extremamente excludente, com consequências para o exercício de direitos por parte desses grupos e para sua própria existência.

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